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quarta-feira, 1 de junho de 2011

5º FICHAMENTO


A introdução na medicina de técnicas oriundas da genética ocasionou uma ruptura antropológica?

Anne Fagot-Largeault

Cátedra de filosofia das ciências biológicas e médicas, Collège de France 
http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1678-31662004000200002&lng=pt&nrm=iso

“No presente artigo é exposto e discutido um conjunto de posições teóricas acerca da aplicação da genética na medicina com vistas a examinar uma possível ruptura antropológica.”

“A descoberta por Watson e Crick da estrutura em dupla hélice da molécula de DNA (Nature, 1953, 171, p. 737-8), cujo qüinquagésimo aniversário foi celebrado com pompa (Nature, 2003, 421, p. 395-453), revolucionou a medicina? Aos olhos dos médicos clínicos, o impacto da genética molecular sobre a prática médica é escasso; aliás, eles colocam a questão para o futuro.”

“Certamente não é a primeira vez que um avanço científico é percebido como portador de uma ameaça de "ruptura antropológica".

"O sentido último da censura que se deve fazer à filosofia de todos os tempos – com exceção do idealismo – é de não ter podido sobrepujar o objetivismo naturalista"

“O clínico John Bell foi encarregado pelos redatores de Nature, para o número comemorativo do cinqüentenário da descoberta da estrutura do DNA, de avaliar esse impacto. Se nos perguntarmos, diz ele, sobre o que revolucionou a prática médica durante a segunda metade do século XX, pensamos na descoberta da penicilina e em seu desenvolvimento por Chain e Florey”

“Um ligeiro giro no horizonte das especialidades médicas confirma que para as doenças monogenéticas, que são doenças raras, o conhecimento genético realmente mudou alguma coisa; trata-se ainda apenas de uma revolução diagnóstica.”

“Além do aconselhamento genético, há um domínio onde as tecnologias oriundas da genética molecular conduziram a uma revolução discreta mas real: a infectologia.”

“Quanto ao câncer, às doenças reumáticas e às doenças imunológicas, as técnicas genéticas começam a produzir complementos diagnósticos ou fatores de prevenção.”

“Todavia, a suspeita difundiu-se: se a genética contemporânea não modifica diretamente o tratamento do diabetes, da hipertensão ou da esquizofrenia, ela indiretamente perverteu o espírito da medicina pela promoção de um reducionismo desumanizante, ao incriminar as causas moleculares em detrimento do tratamento global das pessoas doentes.”

“Segundo os historiadores, a medicina tornou-se oficialmente molecular em 1949, com a publicação na Science do artigo de Linus Pauling e colaboradores, intitulado "Sickle cell anemia, a molecular disease" ("A anemia falciforme, uma doença molecular.”

“Reconstruindo cuidadosamente a história da pesquisa sobre essa doença, Feldman e Tauber estabeleceram que a anemia falciforme (mais tarde chamada drepanocitose), caracterizada em 1910 através de critérios clínicos (anemia com úlceras nas pernas) por ocasião da descrição do primeiro caso, já era considerada hereditária (com transmissão mendeliana dominante, acreditava-se;”

“Henk ten Have recusa a objeção de que suas advertências não repousam sobre fatos objetivos. Algumas de suas propostas lembram as de Hans Jonas, mas ele recorre essencialmente a Michel Foucault.”

“Em seu livro sobre as biotecnologias, Claude Debru (cf. Debru & Nouvel, 2003) traça um excelente histórico da engenharia genética: o seu início (1972), a tomada de consciência acerca dos riscos da pesquisa, a moratória e as medidas de segurança resultantes do processo de Asilomar, os primeiros sucessos – a síntese da insulina humana por uma bactéria (depois por uma levedura) geneticamente modificada (1978), a criação de plantas (1980) e de animais (1981) transgênicos e, depois, os ensaios (desajeitados ou prematuros) de terapia gênica no homem.”

“As possibilidades de jogar assim com a reprodução humana são incontáveis. Certos autores não hesitam em antecipar um "melhoramento genético" (cf. Gordon, 1999) de nossa espécie mediante a correção, nos primeiros estágios embrionários, dos defeitos genéticos identificáveis.”

“Alguns filósofos tentaram formular princípios reguladores desses avanços tecnológicos. Para Jürgen Habermas (cf. 2002), a idéia de que um ser humano possa ser, por menor que seja, uma construção tecnológica (porque, por exemplo, ter-se-ia nele corrigido um defeito genético) é inaceitável.”

“Que nos seja permitido, para concluir, voltar a um ponto de vista dos médicos clínicos, com um tom menos trágico e também menos grandioso, sobre o que evocam as inquietudes antropológicas anteriormente em questão. Com a preocupação de que os riscos das aplicações médicas da genômica aprofundem a distância entre os países do norte e do sul, dois pesquisadores (cf. Alwan & Modell, 2003) publicaram em janeiro de 2003 uma recomendação na Nature Genetics: eles argumentaram que certas técnicas de diagnóstico genético são atualmente simples e baratas o bastante para serem tão acessíveis quanto a medida da temperatura, da pressão arterial ou da glicemia; que os serviços de saúde, onde eles existem, poderiam e deveriam incorporá-las àquilo que a OMS denomina cuidados de base, oferecidos nos postos de saúde.”

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